WWF Portugal: Governo tenta enfraquecer metas climáticas da UE
28 Maio 2025
A WWF Portugal apela ao Governo que alinhe a sua atuação com a ciência e com a urgência da crise climática, contribuindo de forma responsável e transparente para metas ambiciosas à escala europeia e global.
A WWF Portugal manifesta grande preocupação com a posição do Governo português nas negociações europeias sobre a meta climática para 2040 e outras políticas ambientais estruturantes. As recentes declarações da Ministra do Ambiente e Energia, Maria da Graça Carvalho, ao jornal Politico, e as intervenções do Ministro da Agricultura, José Manuel Fernandes, no Conselho de Ministros da Agricultura da UE, evidenciam uma ação concertada para enfraquecer compromissos cruciais no combate à crise climática e ecológica. Trata-se de uma mudança de posição alarmante, que coloca em causa a responsabilidade do país face aos desafios ambientais globais.
1. Portugal tenta condicionar meta climática com múltiplas exceções
Em declarações ao Politico, a Ministra do Ambiente e Energia defendeu que o apoio de Portugal à meta europeia de pelo menos 90% de redução de emissões líquidas até 2040 depende de um conjunto de exceções, incluindo a exclusão de emissões de incêndios, a consideração de créditos externos e um “tratamento especial” para setores como a agricultura. Para a WWF, esta posição representa um recuo face à urgência reconhecida pela ciência, num momento em que a UE deveria assumir um papel de liderança global, alcançando a neutralidade carbónica já em 2040, como defendido num relatório recente da própria WWF.
2. Proposta de contabilizar projetos externos levanta riscos de integridade
A mesma entrevista revelou que a Ministra propõe a contabilização de investimentos portugueses em energias renováveis em países “maioritariamente lusófonos” como contribuição para os objetivos climáticos nacionais. Embora o Acordo de Paris preveja cooperação internacional, a sugestão de incluir projetos fora do âmbito formal do acordo levanta sérios riscos de dupla contagem e enfraquecimento da integridade do esforço europeu, desresponsabilizando o papel do Estado dentro de fronteiras. A WWF alerta que Portugal deve focar-se na descarbonização da sua economia doméstica e não procurar atalhos sem regulamentação e que desresponsabilizem o país.
3. Exclusão de emissões dos incêndios: uma proposta perigosa e incoerente
A proposta, também avançada por Maria da Graça Carvalho, de que as emissões resultantes dos incêndios florestais não sejam atribuídas a Portugal, ignora que a vulnerabilidade do território ao fogo e as medidas de prevenção resultam, em larga medida, de políticas nacionais. A WWF sublinha que a prevenção estrutural exige restauro ecológico, diversidade de usos do solo e paisagens mais resilientes. Ao invés de procurar subterfúgios, o Governo deve investir na transformação sustentável do território.
4. Agricultura sob “tratamento especial” em vez de transição justa
Reconhecemos os desafios específicos do setor agrícola, mas a proposta da Ministra de um “tratamento muito inovador e especial” deve ser avaliada com cautela, principalmente considerando que o apoio a práticas agrícolas intensivas em emissões através da Política Agrícola Comum é hoje uma das principais incoerências da política climática europeia. Além disso, cabe ressaltar a atuação do Ministro da Agricultura, José Manuel Fernandes, que, segundo noticiado pelo jornal Público, liderou um grupo de 11 Estados-membros que pediu à Comissão Europeia o adiamento e enfraquecimento da aplicação do regulamento europeu contra a desflorestação importada. Para a WWF, esta atuação revela uma contradição gritante entre o discurso climático e as práticas políticas. O setor agrícola deve ser apoiado na sua transição ecológica e não isentado de responsabilidade, sob pena de perpetuar modelos insustentáveis.
5. Proposta de trajetória adiada compromete eficácia e justiça climática
Por fim, a proposta de Portugal de adotar uma trajetória não linear – com cortes de emissões mais suaves até 2035 e um esforço concentrado no final da década – enfraquece a eficácia da ação climática e distribui de forma injusta os esforços ao longo do tempo. A ciência é clara: quanto mais cedo forem feitas as reduções, maior será o impacto na contenção do aquecimento global e menores os custos sociais e económicos.
A WWF Portugal sublinha que Portugal tem todas as condições para ser líder na ação climática: um elevado potencial de energias renováveis, uma sociedade civil mobilizada e uma biodiversidade única. No entanto, essas vantagens não se concretizam com propostas que desresponsabilizam o país ou enfraquecem os mecanismos europeus. O momento exige ambição, coerência e solidariedade.
“O Governo está a colocar em risco a credibilidade de Portugal no compromisso climático europeu, ao apostar em soluções que enfraquecem a ambição e abrem portas a exceções que comprometem a integridade das metas. Num momento em que as crises climática e de biodiversidade exigem respostas urgentes e claras, o que precisamos são metas firmes, compromissos inequívocos e ações concretas que garantam uma transição justa e eficaz. A luta contra as alterações climáticas não pode admitir atalhos nem retrocessos,” alerta Bianca Mattos, Coordenadora de Políticas da WWF Portugal.
A WWF Portugal apela ao Governo que alinhe a sua atuação com a ciência e com a urgência da crise climática, contribuindo de forma responsável e transparente para metas ambiciosas à escala europeia e global.